Equipe Mulher da Palavra
20 de jul de 20177 min
Árvore Genealógica
Segundo os pregadores da “maldição hereditária”, quando se constata alguma maldição na vida de alguém, de alguma coisa ou lugar, deve-se pesquisar os motivos pelos quais a maldição teve amparo; i, é, a “brecha”.
No caso de coisas, pode-se fazer uma pesquisa de sua procedência (quase sempre são objetos oriundos de culto afro). No caso de lugares é necessário fazer uma pesquisa (em muitos casos muito dispendiosas – para se descobrir as causas da maldição). Por exemplo, o Brasil sofreria a maldição da miséria porque na colonização os portugueses teriam aberto “brecha” roubando o tesouro nacional e, os políticos de hoje, ainda causam esta brecha.
No caso de pessoas, faz-se necessário pesquisar os ancestrais do indivíduo, para ver se alguém, no passado, cometeu algum pecado e, consequentemente abriu a “brecha”, desencadeando uma maldição. A essa pesquisa dos ancestrais chama-se árvore genealógica.
Vejamos o que diz Robson Rodovalho, em seu livro “Quebrando as maldições”:
“…quando percebemos existir maldições hereditárias nas pessoas, pedimos para que ela faça um gráfico da árvore genealógica, até a Quarta ou Quinta geração ou até onde tem informações. E tentem escrever como foram aqueles antepassados. Como foram suas práticas, vícios e a história da vida deles. A partir dali, tentamos discernir se existem maldições que entraram na família, e em oração os quebrar. Temos que até interceder, pedir perdão por pecados que aqueles antepassados tiveram, e quebrar os pactos que fizeram.”[1]
Ainda instruindo seus leitores a realizar tal prática, Robson Rodovalho indica como fazer esta árvore genealógica: (1) Começar desenhando as raízes que representam a herança familiar; (2) Desenhar o solo que representa o apoio com que conta a família; (3) Pensar e desenhar o tipo de árvore que deseja representar; (4) Desenhar um galho representando cada pessoa da família; (5) Colocar o nome da família na parte superior do desenho; (6) Comentar sobre o desenho ao cônjuge.
A Bíblia nos orienta a fazer uma árvore genealógica da nossa família?
O conselho dos mestres da maldição hereditária para se fazer um histórico familiar, a fim de colher informações sobre alguma maldição que porventura tenha entrado na família, não encontra respaldo bíblico.
Uma primeira consideração a ser feita é que a Bíblia nos ensina que cada um é responsável por aquilo que faz. O profeta Ezequiel fala sobre isso:
“Veio a mim a palavra do Senhor, dizendo: Que tendes vós, vós que, acerca da terra de Israel, proferis este provérbio, dizendo: Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos é que se embotaram? Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, jamais direis este provérbio em Israel. Eis que todas as almas são minhas; como a alma do pai, também a alma do filho é minha; a alma que pecar, essa morrerá.” (Ez 18:1-4)
No contexto deste texto, muitos estavam colocando a culpa de seus fracassos em seus antepassados. Mas, Deus trata com cada um individualmente.
É claro que com os pecados dos pais, os filhos podem colher o fruto deste pecado, sendo influenciados a cometerem os mesmos pecados, e a sofrerem as conseqüências disto (Gl 6:7). No entanto, isto é quebrado quando a geração se arrepende de seu pecado. A Bíblia nos diz que cada um dará conta de si mesmo a Deus (Rm 14:12). Não se pode arrepender-se em lugar de outro.
Uma segunda consideração a ser feita é que fazer árvores genealógicas assemelha-se muito com a prática da seita mórmon. Eles fazem isso com o intuito de resolver problemas espirituais de seus mortos, através do batismo pelos mortos. Isso é antibíblico. A Palavra de Deus condena tal prática (I Tm 1:4; Tt 3:9).
O texto bíblico mais usado para apoiar a ideia da árvore genealógica é Ex 20:
“…eu sou o Senhor, teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até à terceira e Quarta geração daqueles que me aborrecem e faço misericórdia até mil gerações daqueles que amam e guardam os meus mandamentos.”
Para aqueles que costumam procurar textos bíblicos para apoiar seus conceitos, este é um “prato cheio”. No entanto, precisamos fazer algumas considerações a respeito deste texto:
(1) O contexto é a aliança de Javé com o povo de Israel.
(2) O texto trata daqueles que “aborrecem a Deus”
(3) O texto trata das consequências do pecado que refletem até outras gerações.
(4) Deve ser interpretado à luz de Ez 18.
Á árvore genealógica à luz de 1 Coríntios
A 1 carta de Paulo aos Coríntios foi escrita no ano 56 d.C, quando o apóstolo estava em Éfeso. A ocasião da carta foi as notícias de inúmero problemas morais e teológicos que estavam presentes na igreja. Havia: divisões (1.18 ss); imoralidade sexual (5.1 ss); litígio entre irmãos (6.1 ss); confusão em relação ao casamento (7.1 ss); arrogância (8.1 ss); confusão em relação ao papel da mulher (11.3 ss); confusão em relação a ceia do Senhor (11.17 ss); confusão relação aos dons (12-14); confusão em relação a ressurreição (15). Os pecados dessa igreja eram tantos que Paulo afirma que tinha que falar a eles, não como a pessoas espirituais, mas como a pessoas carnais (3.1).
Curioso que, diante de tudo isso, Paulo não pensou que os crentes de Corinto estavam debaixo de maldição, como o fazem os mestres de maldição hereditária. Ao contrário, ele os chamou de santificados (ηγιασμενοις – 1 Co 1.2; 6.11). É curioso notar que o verbo está no tempo particípio perfeito passivo; ou seja, os Coríntios já foram declarados santos. Paulo também os chama de santos quando trata do litígio entre os irmãos (1 Co 6.1), os seus filhos são santificados (1 Co 7.14) e menciona a coleta para os santos.
Na saudação inicial da carta, Paulo afirma ainda que eles já haviam recebido a graça de Deus por meio de Jesus Cristo (1.4), que eles eram ricos em toda palavra e conhecimento, e que foram chamados por Deus para a comunhão de Jesus.
Note, nenhuma maldição! Por que? Porque os crentes de Corinto já foram abençoados com a comunhão com Deus que advém do sacrifício de Cristo (1 Co 10.16).
Agora, como Paulo auxiliou os crentes de Corinto a resolver os problemas que os assolavam? Embora os crentes de Corinto tivessem muitos problemas morais, Paulo não os orienta a fazer uma árvore genealógica, a pesquisar os pecados de algum ancestral (muito menos se arrepender por eles). Também não deveriam fazer jejuns, ou sessões de quebra de maldição.
Diante dos problemas da igreja de Corinto, o que Paulo faz é exortá-los. Essa exortação era feita a “irmãos” (1.10; 2.1; 3.1; 4.6; 7.24; 10.1; 11.33; 12.1; 14.20; 15.1; 15.58; 16.15).
Vejamos então as exortações de Paulo:
a. No que tange a divisão, o apóstolo roga que entrassem em acordo e fossem unidos (1.10);
b. Diante da imoralidade sexual de um sujeito que tinha relações sexuais com a mulher do próprio pai, Paulo não diz que a culpa é do avô dele que supostamente deu legalidade ao diabo, mas exorta à igreja a discipliná-lo (5.5);
c. Mediante o litígio, Paulo dá uma bronca nos crentes de Corinto e ordena que eles julgassem as causas entre os irmãos (6.1);
d. Para o casamento, Paulo dá orientações específicas. Ele não ordena a quebra de maldições que supostamente possam haver no casamento (7);
e. Sobre orientações em relação à carne sacrificada a ídolos, de acordo com os mestres de maldição hereditária, Paulo deveria orientar os crentes de Corinto a se abster da carne porque essa poderia transmitir espíritos familiares, maldições terríveis. Definitivamente Paulo não pensava assim. A orientação que Paulo da é que o “ídolo no mundo não é nada” (1 Co 8.4). Assim, eles deveriam tomar cuidado em não comer a carne, não por conta de supostas influências maléficas, mas para não escandalizar alguns que tinham a consciência fraca (1 Co 8.7 ss);
f. No caso das mulheres, Paulo esclarece o papel das mulheres no lar e na igreja (11);
g. Sobre a ceia, Paulo exorta-os a faze-la dignamente (11.28);
h. A respeito dos dons, Paulo não menciona nenhum sequer que seja de identificar espíritos familiares, mas que aqueles dados pelo Espírito devem ser exercidos com ordem e decência (1 Co 14.40).
i. Diante dos erros doutrinários (embora sejam provocados pelos demônios – 1 Tm 4.1), este devem ser combatidos com o ensino correto das Escrituras. Veja que Paulo afirma que Cristo morreu pelos nossos pecados e ressuscitou, conforme diz as Escrituras (1 Co 15.3,4).
No fim de todas as exortações e orientações que Paulo da aos crentes de Corinto, Paulo afirma algo interessante:
“Se alguém não ama o Senhor, seja maldito! Vem, Senhor” (1 Co 16.22).
A verdadeira maldição não está sobre os crentes, mas sobre aqueles que permanecem no pecado rejeitando a obra salvífica de Jesus Cristo. Estes permanecem no estado de rebeldia, separação em relação ao Criador e, por isso, sob maldição!
Diante de tudo o que foi exposto acima, preciso fazer algumas considerações finais.
Penso que é mais fácil culpar os outros pelos próprios erros do que reconhecer o seu próprio. É mais fácil dizer que a responsabilidade pelo meu pecado é do meu bisavô que era um beberrão do que assumir os meus próprios erros.
Além disso, repreender demônios, responsabilizando-os pelos pecados que cometemos, é na verdade uma fuga. Desde o Edem, preferimos responsabilizar a mulher e a serpente do que arrepender-se e buscar no Senhor a restauração. Mas não é esse o caminho que nos leva à santidade.
Famílias inteiras têm sido escravizadas e vivido em inúmeros conflitos porque acreditam cegamente que intempéries da vida decorrem de alguma maldição, quando deveriam depositar sua confiança no sacrifício suficiente de Cristo.
A doutrina de maldição hereditária é mais um produto do sincretismo religioso que é muito comum no Brasil. Precisamos nos voltar à Palavra de Deus, crendo que tudo o que Ela nos diz é inspirado, verdadeiro, autoritativo e suficiente. Sola Scriptura!
Pr. Nelson Galvão
Sola Scriptura
[1]Robson Rodovalho- Quebrando As Maldições Hereditárias- p. 29
Confira os demais textos da série “Teologia e Família: Maldição hereditária”:
Parte 1 – Cuidado com a maldição
Parte 2- Maldição hereditária: cristianismo ou paganismo?
Parte 3- Não consigo deixar o pecado, sou vítima de uma maldição?
Nelson é casado com Simone desde 1997 e eles têm um filho. Ele é formado em História e Teologia, pós-graduado em Administração Escolar e mestre em Educação (PUC-SP). Atualmente faz mestrado em Teologia do Novo Testamento no Seminário Bíblico Palavra da Vida- Atibaia, SP.
É pastor interino da Igreja Batista Sião (São José dos Campos-SP) e atua como diretor acadêmico do ministério Pregue a Palavra.
Atua ainda como coordenador do grupo do Pregue a Palavra de Cuba e como professor convidado da Escola de Pastores PIBA.